quarta-feira, dezembro 19, 2007

Mais um conto de natal

Por Débora Camargo

Era um fim de tarde bastante quente, abafado. Antonio saíra do trabalho e ia para casa. Sentiu vontade de ir caminhando. Sabia que demoraria muito mais, porém, já havia resolvido.
Olhava as pessoas, a rua, as cenas. Pensava consigo como era interessante observar.
Quando ia de metrô, era tudo tão rápido, tão escondido embaixo da terra, que nem sequer levantava os olhos. Nada via.
Hoje seria diferente. E gostou mesmo de observar.
Começou a olhar as vitrines de natal. Tudo muito bem arrumado, dourado, cheio de produtos convidativos. Havia muita música.
Passeou os olhos sobre as crianças em frente à loja de brinquedos. Tinham esperança estampada nos rostinhos. Era o desejo de que aqueles presentes então fossem seus. Afinal, era natal.
Viu também uma senhorita carregada com sacolas. Andava apressada. Parecia que tinha feito as compras para a grande ceia. Pelas beiradas das embalagens, percebia-se garrafas de vinhos, caixas de bombons, queijos, coisas de dar água na boca.
Do outro lado, viu um ambulante vendendo cartões de natal. Chamava a atenção dos possíveis clientes, dizendo: “não esqueçam dos amigos neste natal, mandem lindos cartões!”.
Antonio continuava, olhou para o relógio e percebeu que ainda havia muito caminho até chegar.
Foi então que, de repente, todas as luzes se apagaram. Uma falta de energia elétrica deixou a cidade escura, silenciosa.
O caminhante instintivamente parou. E agora?
Não sabia mais o percurso. Faltava-lhe direção.
Não havia vento e aquele calor parecia intensificar-se.
Antonio começou a sentir suor escorrendo pelo rosto. Estava ali aterrorizado. Não conseguia mexer-se. Ouvia ruídos que não sabia de onde vinham, nem o que eram.
Um pensamento de pânico surgiu-lhe e imaginou que ficaria para sempre naquela escuridão.
Quase pensou em gritar, mas nem isso parecia poder fazer. O suor então pareceu-lhe gelado. Seu corpo tremia.
Quando já não agüentava mais, as luzes acenderam e tudo voltou ao normal.
Antonio sentia-se ridículo. Parado ali, sem norte.
E percebeu o que tinha acontecido.
Ao andar pela cidade festiva pela chegada do natal, repleta de sons e luzes por todo canto, Antonio tinha sensação de segurança. As coisas realmente existiam, estavam ali.
Mas quando tudo ficou escuro, em silencio, o chão sumiu-lhe dos pés. O medo tomou conta por que não tinha mais nada a que se apegar.
Lembrou-se então do texto nas Escrituras Sagradas: “O povo que caminhava em trevas viu uma grande luz; sobre os que viviam na terra da sombra da morte raiou uma luz.”
Isaías profetizava acerca da vinda do Messias, do Filho de Deus.
Ficou tudo muito bem claro para Antonio.
Havia se esquecido da verdadeira luz do Natal.
Entendeu que assim como ele muitas pessoas têm buscado falsas luzes. Têm encontrado solidão, medo, desespero.
Estão perdidas numa cidade escura.
Lembrou-se ainda de outro texto “...por que um menino nos nasceu, um filho se nos deu e o governo estará sobre seus ombros e seu NOME será: MARAVILHOSO, CONSELHEIRO, DEUS FORTE, PAI DA ETERNIDADE, PRINCIPE DA PAZ...”
Seguiu seu caminho, olhando para a luz do Cristo do Natal, em paz.

(19.12)

domingo, dezembro 16, 2007

blog do Pavarini

leia:

www.pavablog.blogspot.com (sal da terra.com um pouco de pimenta)

quinta-feira, dezembro 13, 2007

repensando musica

(por Fabinho Silva em www.raizdumaterraseca.blogspot.com)


No princípio, criou Deus os céus e a terra. E, segundo alguns, criou cantando. Embora isso não esteja escrito explicitamente na Bíblia, eu acredito nisso. Crença minha, do CS Lewis, do JR Tolkien, e dum lote d'outros que inspiraram esses dois pensadores-romancistas.
Faz sentido. A música é tão importante, mas tão importante, que deve ter sido criada antes mesmo da criação, antes da terra ser habitada por homens e mulheres. E deve ser por isso que tanta gente que mexe com música na igreja se ache assim, digamos, tão divina. Porque, afinal de contas, a música se tornou a coisa mais importante nas igrejas de crente.

Mas - que surpresa - a música, tão divina, não é privilégio dos crentes, e todo mundo, em todos os países, raças, tribos, povos, línguas, religiões... Todo mundo tem alguma coisa com música de alguma forma. Alguns usam a música para rituais religiosos, outros para puro entretenimento.
Se veio daí a invenção da distinção entre "música do mundo" e "música de Deus" - a saber, música de Deus é a que se performa nas igrejas de crente, e música do mundo é tudo o que não se toca nas igrejas de crente - não sei. Mas isso se tornou a regra.

Se a música que toca nas igrejas é de Deus, então ela tem que ter um tratamento especial. E as pessoas que trabalham com música na igreja, são também pessoas especiais. São mais divinas que as outras. No templo de Israel havia os levitas, que eram os caras, os especiais. Hoje, nos templos crentes, também temos levitas. A função dos levitas crentes é fazer o melhor para o Senhor, levando a igreja ao mais perto possível da adoração perfeita através da música. Todo levita que se preze tem convicção que sem seu trabalho a igreja não poderá agradar o coração de Deus.
Isso não foi sempre assim tão claro na história da igreja, mas é porque a igreja não havia evoluído ainda e não tínhamos assim tanta facilidade de ter instrumentos e microfones e equipagem de som de última geração. Os pobres crentes do passado ainda não tinham tido a visão do fazer o melhor pro Senhor, e nem poderiam, pois ainda não havia microfones Shure. A bem da verdade, sempre tivemos crentes que quiseram trabalhar na igreja, a qualquer custo, mas naqueles tempos a música era só mais uma opção. Ah, mas nos tempos da nova visão de fazer o melhor pro Senhor, a primeira opção é fazer parte do ministério de música, pois é aí que reside o mistério da divindade.

Como os corais andam caindo em desuso, e o número de microfones e plugs de entrada de instrumentos disponíveis ainda é limitado, já viu, né? Briga de foice pra conseguir uma vaga entre os levitas, com mortos e feridos. E briga de foice pra manter os levitas unidos: sempre tem um mais divino que o outro, e pra manter a concorrência interna em níveis aceitáveis, só modernas táticas de gerenciamento de equipes pra dar conta.

No lado de lá, sentados ou em pé, está a congregação, o corpo de Cristo, os irmãozinhos da igreja, que precisam de ajuda e direção para adorarem ao Senhor. Tem uns três tipos de crentes que estão lá: o primeiro acredita que os levitas lá em cima são os caras, divinos mesmo, ungidos do Senhor, e sem eles seria impossível acontecer adoração. O segundo não acredita nem desacredita, acha tudo bonitinho, e prefere não pensar a respeito. O terceiro morre de inveja que não é levita, e torce pra que arrebente a porcaria da corda da guitarra e que uma mosca entre na boca daquela cantora que se acha. Ah, tem outro tipo ainda, que acha uma bobagem enorme esse negócio de "música do mundo" e "música de Deus", mas esses provavelmente nem crentes são.

Outro dia perguntei pra uma pessoa desse grupo adicional, o que ela achava dessa discussão toda. Segundo essa pessoa, tudo o que o público (foi assim que ela chamou a congregação que senta ou levanta pra ouvir música na igreja) quer, os artistas (como ela chamou os levitas) buscam fazer. Numa frase: "Os levitas de hoje fornecem entretenimento travestido de louvor e adoração pra um público que finge não estar se entretendo atrás de uma aparência de espiritualidade - o que normalmente redunda em música e vida de má qualidade."

Meu...

Biblicamente falando, música faz parte do culto, sem dúvida nenhuma. O que fazer, então, pra que não haja fingimentos nos cultos?
Eu sei lá.

Talvez repensar o que está sendo feito, pensar um pouco diferente... Pensar é bom.

- deixar de dar tanta importância assim pra música nos cultos seria um bom começo... Quem sabe eliminando os grupos que detêm poder musical e transferindo poder de decisão para a congregação. Como se fora uma roda de viola, como se fazia antigamente nos cultos domésticos: quem toca, carrega seu próprio instrumento, ninguém dirige, todo mundo canta e toca junto. Sem ensaiar mesmo. Sem amplificadores ou dez pessoas ao microfone dirigindo outras dez. Nem dá pra ouvir a congregação cantando... Menos importância pra música, menos gente se matando pra fazer parte da trupe dos levitas.
- a música nos cultos deveria ser uma coisa harmônica... Momento de cânticos levíticos sem conexão com o andamento do culto é muito comum... Aliás, liturgia não é palavrão nem nome de doença grave. Não fica estranho quando se começa um culto com um típico hino tradicional de adoração ("Ao Deus de Abraão Louvai"), e 20 minutos e mais dois hinos e um solo e um hino pelo coral e confissão de pecados e leitura de salmos depois alguém anuncia que vai começar o momento de adoração? "Vamos todos juntos adorar ao Senhor agora", convida o levita...
- se a música for encarada como sendo aquilo que ela é (uma manifestação cultural, uma expressão artística concebida por seres humanos), vai facilitar muito o fim desse fingimento de adoração que às vezes acontece. A dicotomia música de igreja versus música do mundo não contribui pra nada, por que as únicas músicas que foram mesmo inspiradas por Deus estão gravadas na Bíblia (ex: os Salmos). O resto, pura manifestação cultural humana. As músicas dos grandes e bem-sucedidos ministérios de adoração que existem é tão divina quanto Chico Buarque.
- As congregações precisam ser estimuladas a pensar mais do que sentir. Esse é o caminho inverso do apregoado pelos mega-ministérios de louvor que dominam rádios e vendas de CDs.
- Nem todo médico é médico só da igreja, e nem todo professor é professor só na igreja. Em conseqüência, nem todo músico precisa ser músico só pra igreja. É maldade acusar um músico de não trabalhar pra Deus se ele não se interessa por fazer parte da banda dos levitas A ou B. Vai que ele faz alguma outra coisa e você não sabe.

“déjà-vu”

De repente olho
E a vejo de pés descalços,
correndo pela vila.

Cabelos de pouco volume
e olhos verdes de chamar a atenção.
Rosto sujo de tanto brincar.
Felicidade.
Sim. É presente.

Amigos, livros, bonecas e sonhos.
Nenhuma foto de aniversario.
Mas a alegria, sempre constante
Compensa a falta de bexigas e comemoração.

Cantorias, brincadeiras sem nexo.
Avó embalando. Família.
Cumplicidade com alguns.
Gira tudo.
Pirulitos coloridos também
Fazendo a cabeça pirar. “Pirulitar”.
É doce.

Como saber o que viria?
Como entender o desenrolar natural?
Olhos verdes espreitando.
Nada via.
Nada sabia.
Isso que é bom.
Viver , correr sem saber.
Amar.
Crescer.



13/12/2007
acabei de ler "confidência do Itabirano", de CDA